sábado, 22 de setembro de 2018

Em tempos de eleições, a ressurreição da importância da palavra




Havia vida na palavra quando se podia ensinar; havia vida nas palavras quando as cordas vocais melodiavam uma cantiga para os atos de escrever e de falar. Havia existência na comunicação quando autor e leitor dialogavam, numa comum relação, mediatizada pelo texto, buscando, através deste, a compreensão do tema, a identificação do problema, a justificação para a defesa daquela tese, assentada na coerente argumentação. Sendo assim, de um texto brotava, primeiramente, a reflexão individual, e, por conseguinte, a discussão coletiva.
Havia vida na palavra quando alguém falava e o outro se sujeitava a escutar; ainda que discordasse daquelas presunçosas premissas, a refinada paciência e a cordial educação o impeliam a ouvir e a tolerar. E, desta forma, todos se contagiavam, e por onde a palavra excursionava, a vida surgia; graças a ela, havia vida na família; havia vida nas escolas, nas igrejas, na sociedade civil.
Das escolas peripatéticas às escolas retóricas medievais, seja andando ou estático, o educando queria ouvir, assimilar, sugerir e debater, porquanto a palavra vitalizava. Havia vida na Patrística e na Escolástica, pois havia reflexão nos centros universitários secularizados e nos monastérios.
As correntes antagônicas, racionalistas e empiristas, marxistas e liberais, capitalistas e socialistas, eram também propulsoras de vida, porquanto entendiam que o conhecimento nascia do conflito, a verdade, do paradoxo e do consenso, e a ciência, da crise.
Não obstante, a partir do século XVIII, emergiram as ditaduras e, em seguida, as falsas democracias com pseudos discursos antropológicos enjaulando, estruturalmente, a polimórfica liberdade. Reificada, passou a ser sinônimo de libertinagem. Se a verdadeira liberdade, outrora, incitava quem se julgava encarcerado, nesta deteriorada concepção, ela afugenta-se de seus pretensos defensores, ora provocando-lhes divagação, ora fazendo-se passar por uma interrogação: Liberdade ? ...
Infelizmente, o atual discurso das nações globalizadas é unilateral e monomórfico, tanto quanto as hodiernas pedagogias, fragmentadas, tornando estéril tanto o poder da palavra como o da crença que ela, anteriormente, ostentava. Hoje, a palavra está sendo aviltada e sentenciada a pena capital, o silêncio: quem pode falar, cala-se, face ao medo das represálias e retaliações; e quem pode, através dela, intervir, prefere a inércia.
Neste novo contexto, a humanidade retrocede e dizima o processo biopsicossocial que lhe garantia a humanização. Voltamos aos grunhidos das cavernas e quando não somos mais compreendidos, cajadadas, pedradas e fogo neles, pois na ausência da comunicação reina a violência, o medo, a indiferença, a covardia. Sujeitos à involução, a violência mundial revela a nossa condição de primata, caracterizada pela intolerância e incompreensão, fazendo-nos consentir com a notícia jornalística que a todos incrimina:
“Comunicamos o desaparecimento da senhora Palavra, às 0h01, do século XXI; filha da Escrita e do Som, irmã e esposa do Alfabeto, deixa muitos descendentes. A causa da morte é, segundo a perícia do Centro dos Seres Supostamente Evoluídos (CSSE), homicídio qualificado, ocasionado pelo silêncio e indiferença dos seus tantos usuários”.
Entretanto, ao escrever uma linha, ao sussurrar uma oração, a palavra, vociferada ou manuscrita, igual a Lázaro, ressuscita, graças ao poder cognoscente inato a nossa humanidade, e, enfim, nos assemelharemos ao Nosso Eterno Criador, que tudo fez e criou pela palavra. 

BENEDITO LUCIANO ANTUNES DE FRANÇA (BENÊ FRANÇA) – 44 anos.
Mestre em Filosofia. Professor da Faculdade de Tecnologia de Americana (FATEC – Americana/SP) e Professor Titular de Filosofia da EE João Franceschini, pela Secretaria Estadual de Educação, em Sumaré/SP.

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Obs.: Artigo originalmente escrito para o Portal "Portugal-linha.pt", conforme link abaixo:
http://www.portugal-linha.pt/200812111810/A-ressurreicao-da-importancia-da-palavra/menu-id-51.html

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