sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Artigo sobre o Dia de Finados: "A morte e o corpo"

O presente texto é uma reedição minha de um artigo já publicado em diversos jornais do Brasil, Estados Unidos e Europa; visa refletir filosoficamente sobre a morte e o corpo, partindo da grande questão existencial, proposta pelo meu amigo Carlão, pai do Félix, morador em Campinas/SP, e comerciante na área de xerox, a quem dedico a atual reedição:

A MORTE E O CORPO


“Se morremos, por que nascemos?”. Para esta questão, o pensamento ocidental concebe a vida, entre outras possibilidades, de duas maneiras distintas: a existência corpórea-material e a existência imaterial.
Na primeira concepção, os pensadores materialistas, desde Demócrito, crêem que o existir humano é caracterizado pela matéria, experienciado pelos cinco sentidos, que captam o mundo circundante. De acordo com os princípios atomistas, a vida é uma trajetória cuja partida é o nascimento, e a chegada, a morte. Nesta visão, o corpo decompõe-se, como um simples mecanismo que se desgasta com o tempo, pelo uso, pelos medos e pelas constantes preocupações com o dia-dia. As pessoas, por conseguinte, procuram esquivar-se do tempo, fazem lipoaspiração, freqüentam spas; trocam de amores e de identidade, vivem expelindo um intenso grito de dor, raramente ouvidas por outrem, pois cada um está cuidando de si mesmo, do próprio ego, do ser ali projetado no espelho, daquela massa corpórea indesejada, etc...
Não obstante, para o filósofo Platão, adepto da segunda concepção, quanto mais próxima a existência da corporeidade, mais limitada e enfadonha será a compreensão acerca da vida. Para ele, melhor do que o corpo é a psiqué, essencialmente imortal, como atesta em sua obra “Fédon”. Sendo imaterial, a alma é transportada pelo corpo, e, portanto, sujeita às degenerações somáticas. Todos, segundo ele, devem renunciar ao corpo e refutar as paixões carnais que apenas promovem um deleite provisório.
É certo que pensar a existência como se fôssemos santos, não é nada fácil; há um quê de perversão em nosso ser que todos sentimos e compreendemos. Ora, na visão do pupilo de Sócrates, a vida não é um limitado movimento retilíneo; na verdade, seria uma espiral, um eterno recomeçar, todavia, sem alterar a essência do que somos. Entretanto, tais asserções dão margem às interpretações religiosas, haja vista que seu fundamento ontológico é a mitologia grega, que admite a existência do Hiperurânio, o “Mundo das Idéias”. Portanto, a crença de que a alma é imortal deriva de um credo mitológico-religioso muito difundido na época do fundador da Academia, porquanto até ele teve que se apegar em algo...
Neste sentido, na perspectiva metafísico-religiosa, as Sagradas Escrituras nos dizem que somos peregrinos nesse mundo desolador, pois há paixões, emoções e alegrias, na mesma proporção em que há percalços, e não poucos. Viver, para o pensamento religioso, é apenas passar por uma etapa, uma fase. Infelizmente, não temos provas convencionalmente aceitas, nem parâmetros que possam corroborar que, de fato, seja assim, exceto a Bíblia, o que requer uma convicção íntima, algo tão difícil, visto que nos acostumamos a aceitar o que os sentidos registram, e, paradoxalmente, a Palavra de Deus requer fé, “fundamento inabalável da esperança” e prova definitiva de “algo que não se vê” (Hb. 11,1).
Uma existência sem a morte, uma vida sem dor, sem começo, nem fim, sempre sendo nós mesmos; verdadeiramente, é algo difícil de compreender, visto que fomos treinados a aceitar somente aquilo que somos capazes de entender, “credum ut intelligam”, e de tocar. Com efeito, para muitos, é mais fácil rotular de “ignorantes” e de “fanáticos” aqueles que, com muito esforço, tentam assimilar e/ou espreitar tal realidade. Na verdade, deveríamos chamá-los de “clarividentes”, seres capazes de enxergar uma realidade pluridimensional num universo nuançado, com um enredo estarrecedor, que a todos inquietam e que requer pelo menos uma reflexão, ainda que discutível.

BENEDITO LUCIANO ANTUNES DE FRANÇA (BENÊ FRANÇA) – 35 ANOS
Mestre em Filosofia. É Professor Concursado da FATEC-Americana, em Americana/SP, e Titular Efetivo de Filosofia das Escolas Estaduais “João Franceschini” e “Profa. Bélgica Alleoni Borges”, ambas em Sumaré/SP, pela Diretoria Regional de Ensino de Sumaré.

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Um comentário:

Thiago Carlos disse...

Amado professor Bene, muito bom o texto, levou-me a uma nostalgia e nova forma de reflexão acerca de nossas escolhas religiosas que muitas vezes são vistas como “radicais”, mas que apenas nos traz benefícios; Outrossim, pessoas de espírito pequeno tendem apenas rotular o que não consegue entender devido aos “vícios da percepção”. O ato da fé é algo muito íntimo e poucos entendem a paz que isso nos traz.
Que a paz do criador do universo esteja em nossos corações.
Agora: 21/02/2010 trabalhando ás 4:15 da manhã.

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